Mrs Dalloway said she would buy the flowers herself.*
Eu penso. Eu sou uma pessoa que pensa. I'm a thinker, I've always been. Desde miúda que eu passo os meus dias a pensar. Mas às vezes tenho a ligeira impressão que se torna uma obsessão. Eu penso e penso e penso. E canso-me de pensar, mas não sei ser eu de outra maneira. E dou com a minha Mami hoje a perguntar-me 'Mas o que é que tu tanto pensas?'. Não interessa. Eu gosto de pensar, gosto de guardar segredos no meu pensamento.
Eu sonho. Sonho muito, todos os dias, a dormir, acordada, de pé ou sentada, I'm a dreamer, I've always been. E gasto centenas de minutos por dia a sonhar, é verdade. Sou uma sonhadora irremediável. Sonho tanto que tenho pesadelos. Ou sonhos que não fazem o mínimo de sentido. Mas sonho, sempre.
Eu faço coisas. Eu faço mil e uma coisas por dia. Eu faço tantas coisas por dia que às vezes até me esqueço de as fazer. I'm a doer, I've always been, I do things. E tudo tem de ser feito por mim, porque ninguém sabe fazer as coisas como eu. Nem eu deixo que as façam por mim, porque há certas coisas que eu quero à minha maneira e que mais ninguem percebe.
O problema é o Tempo. O Tempo dá cabo de mim, confesso. O Tempo, essa única coisa contra a qual não podemos lutar. E eu assumo, eu tenho problemas com o Tempo. Mas porque é que existe o Tempo? Porque é que é tão importante o Tempo? Porque é que não podemos viver sem ele? Não lhe podemos pedir que nos dê..tempo? Eu podia viver sem ele. Eu podia viver como vive a Lebre de Março e o Chapeleiro que se zangaram com o Tempo e que, por isso, no seu mundo são eternamente cinco horas, a hora do chá. E se nos zangássemos com o Tempo e ele parasse? E não houvesse correrias nem atrasos nem horas marcadas. Nem tempos passados, nem tempos presentes, nem tempos futuros. Eu sei, era o caos. Mas confesso que o caos se me tem apresentado não tão...caótico ultimamente. Eu preciso de tempo para enfrentar o Tempo.
Bem sei, nada disto faz o menor sentido. É uma confusão permanente. Mas eu passo a explicar. Wuthering Heights, já leram? Bem, é a obra que ando a ler e que me tem absorvido e me tem fechada dentro das quatro paredes daquela casa. E agora que vou a meio da leitura sei que é preciso ter-se uma bagagem emocional tremenda para conseguir suportar, sim, suportar todo aquele enredo. E o mais extraordinário é que não sou eu que tenho lido a obra, parece que é a obra que me tem lido a mim. Eu sonho com os pesadelos do Mr Lockwood quando dorme no quarto da Cathy, eu quase que oiço o forte vento à volta de Wuthering Heights e eu vibro com a personalidade do Heathcliff e tento perceber os motivos da Cathy. E também o Tempo se intromete entre eles, porque se a Cathy não tivesse passado cinco semanas em casa dos Linton não se tinha tornado numa miúda arrogante e mimada e teria ficado ligada ao Heathcliff. E se o Heathcliff não tivesse desaparecido durante três anos muita coisa poderia ter acontecido. E eu tenho-me visto completamente perdida naquele lugar, pleno de locus horrendus, mas que tão bem me iria acolher.
É tal e qual como eu digo, o Tempo tudo transforma. E é tudo isto que eu tenho de suportar, calada, no meu canto calmo e pacífico, à partida perfeito. São dias, horas, minutos e segundos de um dia inteiro a lutar, é toda uma luta constante que me acompanha. Sim, eu luto, quem diria. Luto. Luto e pronto. Mas é uma luta desigual, porque nada posso fazer contra o Tempo.
A woman's whole life in a single day. Just one day. And in that day her whole life.**
And between me and myself always the years. Always the love. Always the hours.**
Hum.. I think I'll probably buy the flowers myself.
* Mrs Dalloway, Virginia Woolf.
** The Hours